Compliance

Paulo Constantino
Background Check
Ferramenta de prevenção na lavagem de dinheiro

A Lei (Federal) nº 9.613, de 03/03/1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro), já alterada e atualizada pelas Leis 10.467/2002, 10.683/2003 e 10.701/2003, dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; sobre a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos na Lei; e cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, entre outras providências.

Essa lei é uma resposta brasileira ao problema mundial da lavagem de dinheiro, assim como, o Background Check é uma ferramenta à disposição das empresas para a prevenção desse crime. Mas, antes de abordar esses dois aspectos, é importante explicar de forma simples e objetiva a finalidade do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF.

Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF

Nos termos instituídos no artigo 14 da Lei 9.613/98, o COAF foi “criado, no âmbito do Ministério da Fazenda” com a finalidade de “disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas” também previstas na referida Lei, “sem prejuízo da competência de outros órgãos e entidades” (por exemplo: BACEN, CVM, SUSEP, SPC, entre outros).

Os parágrafos 2º e 3º do mesmo artigo determinam, respectivamente, que “o COAF deverá, ainda, coordenar e propor mecanismos de cooperação e de troca de informações que viabilizem ações rápidas e eficientes no combate à ocultação ou dissimulação de bens, direitos e valores”; e que “poderá requerer aos órgãos da Administração Pública as informações cadastrais bancárias e financeiras de pessoas envolvidas em atividades suspeitas”. E o artigo 15 ainda reforça: “O COAF comunicará às autoridades competentes para a instauração dos procedimentos cabíveis, quando concluir pela existência de crimes previstos nesta Lei, de fundados indícios de sua prática, ou de qualquer outro ilícito”.

As autoridades competentes para as quais os relatórios são encaminhados podem ser:

Ministério Público Federal, Ministério Público nos Estados e o Departamento de Polícia Federal (bem como outras autoridades competentes e Unidades de Inteligência Financeira estrangeiras).

Trata-se, portanto, de uma verdadeira unidade de inteligência para o combate à lavagem de dinheiro. A sua atividade não é de investigação, mas de detecção de movimentos ou operações atípicas de recursos que sugerem procedência ilícita; culminando com o encaminhamento informações sobre pessoas com nível suficiente de suspeitas à Polícia Federal e ao Ministério Público (Promotoria de Justiça), para investigação ou acionamento judicial. Assim, verifica-se que os resultados surgem da análise das informações que são transmitidas por entidades de diversos setores da economia, além do cruzamento delas pelo próprio COAF.

A estratégia adotada pelo COAF é conhecida pela expressão “siga o dinheiro”, e surgiu ainda nos anos 80, quando diversos países resolveram combater os cartéis do tráfico de drogas, estrangulando literalmente as suas operações financeiras.

Conceito de lavagem de dinheiro e os crimes que a antecedem

O conceito de crime de lavagem de dinheiro vem explícito no artigo 1º da Lei 9.613/98 e os demais crimes que antecedem a lavagem – que geram os recursos passíveis de manobras ilícitas para revesti-los com aparente legalidade – seguem relacionados em seus incisos:

Artigo 1º. Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

I. de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;

II. de terrorismo e seu financiamento;

III. de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção;

IV. de extorsão mediante sequestro;

V. contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;

VI. contra o sistema financeiro nacional;

VII. praticado por organização criminosa.

VIII. praticado por particular contra a administração pública estrangeira.

Determinações da Lei 9.613/98

Prevê a Lei 9.613/98 que as pessoas jurídicas relacionadas no artigo 9º (mais adiante) “dispensarão especial atenção” às operações financeiras que (conforme instruções das autoridades competentes), possam constituir-se em sérios indícios dos crimes previstos de lavagem de dinheiro, “ou com eles relacionar-se”, devendo comunicar aos órgãos reguladores, “abstendo-se de dar aos clientes ciência de tal ato”. Não existindo um “órgão próprio fiscalizador ou regulador” as comunicações devem ser direcionadas ao Conselho de Controle das Atividades Financeiras – COAF.

Dentro dessa “especial atenção”, as entidades responsáveis deverão identificar e manter cadastro atualizado dos seus clientes (conforme instruções das autoridades competentes) e “registro de toda transação em moeda nacional ou estrangeira, títulos e valores mobiliários, títulos de crédito, metais, ou qualquer ativo passível de ser convertido em dinheiro, que ultrapassar limite fixado pela autoridade competente e nos termos de instruções por esta expedidas”;

observando-se que, no caso de pessoa jurídica, as pessoas físicas autorizadas a representá-la e seus proprietários igualmente deverão ser identificados.

Pessoas sujeitas à Lei 9.613/98 Estão sujeitas à obrigação de informar as operações financeiras que se enquadrarem nas normas específicas estabelecidas pelos respectivos órgãos reguladores, as pessoas jurídicas, nos termos do artigo 9º da Lei 9.613/98 – “que tenham, em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não”:

  • a captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira;
  • a compra e venda de moeda estrangeira ou ouro como ativo financeiro ou instrumento cambial;
  • a custódia, emissão, distribuição, liquidação, negociação, intermediação ou administração de títulos ou valores mobiliários;
  • as bolsas de valores e bolsas de mercadorias ou futuros;
  • as seguradoras, as corretoras de seguros e as entidades de previdência complementar ou de capitalização;
  • as administradoras de cartões de credenciamento ou cartões de crédito, bem como as administradoras de consórcios para aquisição de bens ou serviços;
  • as administradoras ou empresas que se utilizem de cartão ou qualquer outro meio eletrônico, magnético ou equivalente, que permita a transferência de fundos;
  • as empresas de arrendamento mercantil (leasing) e as de fomento comercial (factoring);
  • as sociedades que efetuem distribuição de dinheiro ou quaisquer bens móveis, imóveis, mercadorias, serviços, ou, ainda, concedam descontos na sua aquisição, mediante sorteio ou método assemelhado;
  • as filiais ou representações de entes estrangeiros que exerçam no Brasil qualquer das atividades listadas neste artigo, ainda que de forma eventual;
  • as demais entidades cujo funcionamento dependa de autorização de órgão regulador dos mercados financeiro, de câmbio, de capitais e de seguros;
  • as pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, que operem no Brasil como agentes, dirigentes, procuradoras, comissionarias ou por qualquer forma representem interesses de ente estrangeiro que exerça qualquer das atividades referidas neste artigo;
  • as pessoas jurídicas que exerçam atividades de promoção imobiliária ou compra e venda de imóveis;
  • as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem joias, pedras e metais preciosos, objetos de arte e antiguidades;
  • as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem bens de luxo ou de alto valor ou exerçam atividades que envolvam grande volume de recursos em espécie.

Da relação acima, os setores regulados pelo COAF são: Bolsa de Mercadorias, Cartões de Crédito, Compra e Venda de Imóveis, Transferência de Numerários, Factoring, Joias, Pedras e Metais Preciosos, Objetos de Arte e Antiguidades, Loterias e Sorteios e Bingos (quando autorizados a funcionar). E os setores com órgão reguladores próprios obrigados a informar o COAF são: Sistema Financeiro (BACEN), Mercado de Seguros (SUSEP), Mercado de Capitais (CVM) e Previdência Fechada (SPC).

Os bancos são obrigados a manter registros e informar, de maneira mais rígida e criteriosa, as operações das chamadas “Pessoas Politicamente Expostas (PEPs)”. E entende-se por PEPs aquelas pessoas que desempenham ou tenham desempenhado no Brasil ou em outros países, nos últimos anos, cargos, empregos ou funções públicas relevantes, assim como seus representantes, familiares e pessoas de seu relacionamento.

Processo preventivo de Background Check

O crime de lavagem pode estar ocorrendo através de pessoas físicas e jurídicas reais, sem mascaramento ou disfarce, ou através dos chamados “laranjas” em atuação como “indivíduo útil” recebendo dinheiro ou bens em seu próprio nome, ou figurando como sócios em empresas de “fachada”; ou através de falsa identidade pessoal e criação de empresas “fantasma”, entre outras variadas artimanhas. E o dinheiro a ser “legalizado” pode estar vindo de diversas fontes, desde os pequenos e pulverizados golpes, obtidos, por exemplo, em fraudes de seguros e de financiamentos, até as ações do crime organizado, de quadrilhas especializadas ou de grandes cartéis de drogas e armas ou megaesquemas de corrupção.

São milhares de indivíduos envolvidos, oriundos das mais variadas classes sociais, profissões, atividades e formação, agindo diuturnamente em diversas frentes ilícitas. Desta forma, a lavagem de dinheiro alcança níveis de elaboração e sofisticação mais elevados, dificultando a detecção.

Ao contrário do que muitas pessoas podem imaginar, o criminoso, no processo de lavagem de dinheiro, não visa esconder ou economizar o capital amealhado ilegalmente; ao contrário, ele o apresenta com a disposição de pagar para dar-lhe uma aparente origem legal. E isto quer dizer que a sua finalidade é recolher os impostos decorrentes e financiar meios para concluir com êxito a inserção desse dinheiro sujo no sistema financeiro, como se fosse limpo e oriundo de transação ou atividade legal.

Assim, o Background Check é uma verificação da identidade das pessoas físicas e jurídicas (incluindo os sócios e administradores) que se relacionam financeiramente com as instituições obrigadas à comunicação das operações, para fins de segurança e de atendimento à determinação legal, checando-se desde a veracidade dos dados cadastrais fornecidos e a integridade legal, comercial, financeira, entre outras, até a existência física. Para tanto, são coletados dados internos disponibilizados pelos clientes, bem como são pesquisados dados externos, disponíveis em diversas fontes.

Coleta Interna – Indicadores

Nas entidades obrigadas às comunicações de que trata a Lei de Lavagem de Dinheiro, a Coleta Interna de dados de pessoas físicas e jurídicas – para a detecção de sinais de ações de lavagem de dinheiro – é realizada através de indicadores cujos dados estão disponíveis em seus sistemas e ao alcance da avaliação dos gestores através de relatórios e análise dos registros cadastrais, onde poderão verificar situações – entre uma infinidade de outras – semelhantes aos seguintes exemplos: aspectos suspeitos como ausência de comprovação de negócios pelos clientes novos e faturamento irreal; sinais de enriquecimento sem causa; transações volumosas em espécie ou movimentação fora da realidade; reativação de contas; incompatibilidade entre as ações do cliente e a simplicidade dos negócios declarados; trânsito quase instantâneo entre créditos em conta e transferências; pulverização de depósitos em diversas agências e sem regularidade de datas; entre muitos mais.

Coleta Externa – Indicadores

A Coleta Externa de dados de pessoas jurídicas e físicas contribui e complementa a análise dos dados coletados internamente, auxiliando na identificação de indícios de envolvimento com lavagem de dinheiro ou atuação em outras operações ilícitas. Mas a coleta externa é uma operação mais complexa e demorada, e deve apresentar um processo estruturado, pessoal treinado e empenho de tempo em pesquisa e análise que os gestores das entidades obrigadas às comunicações legais de controle e fiscalização não dispõem (não faz parte do core; não é a atividade fim). Diante disso, há a necessidade de desenvolver uma área específica ou terceirizar.

O fato é que, nesta coleta de dados externos é preciso uma total interação humana, uma vez que o elemento humano é o único recurso que possui a premissa ou capacidade de interpretar o que a programação das máquinas ainda não consegue realizar; ou seja, o elemento humano trabalha com a lógica intuitiva, para a efetiva identificação das conexões nos relacionamentos comerciais e pessoais levantados. Portanto, pessoal treinado e capacitado é essencial.

Análise de causa e efeito na Coleta Externa do Background Check

Entre os serviços de Background Check disponíveis no mercado brasileiro, um exemplo a ser destacado é o processo estruturado dentro dos padrões já consolidados de análise de risco desenvolvidos pelo Prof. Dr. Antonio Celso Ribeiro Brasiliano, que estuda a relação de causa e efeito entre a lavagem de dinheiro e os dados da Coleta Externa.

No Método Brasiliano, as fontes de dados do Background Check são classificadas através dos seguintes Indicadores Externos e respectivos pesos, dispostos em uma adaptação do Diagrama de Causa e Efeito (figura adiante):

  • Bases Governamentais (peso 4),
  • Controle Societário e Dados Cadastrais (peso 5),
  • Demonstrações Financeiras (peso 5),
  • Listas de Restrições Sanções (peso 3),
  • Negative News Run (peso 4) e
  • Pessoas Expostas Politicamente (peso 3).

E convém salientar que essas fontes são legais, públicas e privadas, e seus dados estão disponibilizados para consulta física direta junto às entidades que as detém, ou através de busca virtual conforme o caso.

Assim, para a efetiva análise, deve-se estabelecer a nota de cada Indicador Externo, tendo em vista a possibilidade de lavagem de dinheiro e a pessoa física ou jurídica em questão.

Desta forma, o Método traz uma escala de notas de 1 a 4 (quadro abaixo) com os seguintes critérios: Baixo Problema (nota 1), Médio Problema (nota 2), Relevante Problema (nota 3) e Muito Sério Problema (nota 4).

Adiante o Diagrama de Causa e Efeito:


Imagens acima: Diagrama de Causa e Efeito e Quadro de Notas para os Indicadores Externos


Legendas: A) Bases Governamentais; B) Controle Societário e Dados Cadastrais; C) Demonstrações Financeiras: D) Listas de Restrições; E) Negative News Run; F) Pessoas Expostas.

Imagem acima: Matriz BCG (Background Check)


Imagens acima: Fórmula da média ponderada e Quadro de Níveis do BGC (resultados)


Matriz BGC (Background Check)

Uma vez estabelecidas as notas dos Indicadores Externos, elas são multiplicadas pelos respectivos pesos e os resultados lançados na Matriz BCG (figura abaixo), oferecendo uma melhor visualização:


Nível BGC (Background Check)

Superadas as fases anteriores, procura-se definir a média ponderada que, na realidade, é o Nível do Background Check para a lavagem de dinheiro em relação à pessoa física ou jurídica analisada, conforme se observa nas demonstrações e indicadores adiante:


Considerações finais

Conforme foi analisado, a fiscalização da lavagem de dinheiro está sendo realizada de forma constante e, embora ainda não seja a ideal, as empresas obrigadas pela Lei 9.613/98 a informar as operações financeiras de seus clientes (que se enquadrarem nas normas específicas estabelecidas pelos respectivos órgãos reguladores) devem seguir o ordenamento, para não sofrerem as rígidas sanções.

Desta forma, o trabalho de prevenção deve ser realizado a contento, somando-se a ele a utilização da ferramenta de Background Check, cuidando, apenas, para que seja aplicada e desempenhada por profissionais com conhecimento específico de cada segmento, treinados e atualizados sobre as ações delituosas e a evolução dos artifícios usados para burlar os controles, além de conhecer a própria legislação brasileira.

No mais, e também para manter a isenção das pesquisas, a terceirização dessa atividade – através de parceiros com reconhecida capacidade e tradição no mercado – é uma opção que se apresenta de forma positiva, havendo com isso, a possibilidade de reduzir custos e otimizar prazos e resultados, flexibilizar a operação, obter customização e renovação dos serviços oferecidos, entre outros fatores relevantes.

Paulo César Leopoldo Constantino

Consultor de Risco e Segurança e Advogado (OAB/SP 103099)

Especialista em Gestão de Riscos e Segurança Empresarial